segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

O meu cão foi para o Céu


O meu cão chama-se D. ou antes, o cão do meu irmão Caçula chamava-se D.
Estava connosco há 17 anos, já estava cego dum olho, por ter sido atropelado, já estava surdo, por causa da idade, e já resistira a um cancro junto da cauda que o fez passar por 3 operações, deixando sempre a veterinária espantada com a sua resistência e vontade de viver.
O meu cão chama-se D. e agora está no Céu.

Esta sexta-feira, quando cheguei a casa da minha Mãe, já bastante tarde, ela contou-me que o Caçula tinha encontrado o D. à chuva, a sofrer uma convulsão ou um ataque epilético, e que tinha estado a tratar dele.
Fiquei apreensiva e desci ao quintal, onde encontrei o D. num abrigo, imóvel, de olhos abertos sem expressão, e a respirar ruidosamente, com dificuldade.
Ajoelhei-me ao pé dele e comecei a fazer-lhe festas, e apercebi-me que ele tinha encharcado, de novo, as mantas secas que o meu irmão lhe tinha posto por cima.
Chamei o Caçula e pedi-lhe ajuda para fazermos uma cama nova, seca, mesmo sabendo que ele poderia sujar tudo, pois estava doente dos intestinos.
O meu mano trouxe mais mantas, e pegou no D., que não se mexia, nem reagia... Parecia em coma.
Colocámos protecção por baixo, as mantas secas por cima, e fiquei de novo a fazer-lhe festinhas.
De coração pequenino e lágrimas nos olhos.

O meu irmão disse-me, numa voz de quem me queria preparar: "Olha que ele não deve aguentar muito mais, se calhar não passa desta noite..."
E eu respondi: "Sim, mas se partir, ao menos que parta o mais confortável possível..."

E deixei-me estar junto dele, a fazer-lhe festinhas...
Ainda se agitou, e o Caçula avisou-me que ele poderia abocanhar-me sem querer, mas tal não aconteceu.
Este cão nunca, mas nunca mesmo, me magoou, nem mesmo sem querer.

Entretanto, o Caçula foi tratar doutros assuntos com o meu N.º 1 e eu fiquei sozinha com o D.

Senti-me tão triste, e doía-me vê-lo assim, a sofrer... Comecei a fazer-lhe reiki, e a rezar. 

E agradeci-lhe, agradeci-lhe toda a companhia e protecção que nos deu estes anos todos, desde que apareceu, num Outono há 17 anos atrás, talvez perdido, talvez abandonado.
Agradeci-lhe ter-nos adoptado, pois assumiu-se como nosso guardião, e protegeu-nos sempre... Num instante, ainda antes de ser oficialmente adoptado, ficou a conhecer os carros todos da casa, e ladrava de forma diferente em função de quem se aproximava e nós sabíamos sempre quem estava a chegar.

Agradeci-lhe todos os cuidados, as brincadeiras, os passeios, e enquanto falava com ele, e lhe fazia festas, senti que ele acalmou e adormeceu, com a respiração mais regular, embora parecesse constipado.

Rezei.
Rezei para que Deus acabasse com o sofrimento dele e o levasse para o Céu enquanto dormia, e de preferência que sonhasse que era cachorro de novo e andasse aos saltos no meio das ervas a perseguir pássaros e borboletas e coelhos.

Deixei-me estar mais um bocado a mimá-lo, até que fui cear, deixando-o a dormir.
Após a ceia, e antes de ir com o meu Músico para a nossa casinha, tive de ir vê-lo de novo.
Dormia... Calmo, sereno, quentinho.

Na manhã seguinte, liguei à minha Mãe a perguntar se já tinha ido ver do D. Ela confessou que ainda não tinha tido coragem, pois receava encontrá-lo morto, mas que o Caçula o tinha ido ver de madrugada e ele dormia.
Disse-me que já me dizia alguma coisa.

Passado um pouco, recebi uma SMS dela a dizer que o D. estava morto.

Chorei, pois este cão não era um cão qualquer, pelo menos para mim.
Foi o meu primeiro cão ou, de certa forma, o único. Nunca tive um cão, e na verdade, este cão era do Caçula, e não "meu" ou "nosso", mas continuo a achar que foi ele que nos adoptou e nos quis para família dele.
Era um cão inteligente e meigo, brincalhão e esperto, com um lindo pêlo cor de avelã e os olhos castanhos e doces.
Só implicava com o cão da vizinha, e com alguns gatos que se atreviam a provocá-lo; e um dia mordiscou o rabo dum senhor que se atravessou à frente dele, numa noite. [O senhor não sofreu nada de muito grave, só umas calças rotas e dois buraquinhos na pele, que ele só estava a "avisar" que não era sítio para andar ali... ;) ]
Até as minhas irmãs e as minhas sobrinhas, menos dadas a animais, gostavam dele e não passavam sem "ir fazer uma festinha ao D.".

Liguei à minha Mãe, que me disse que ele parecia dormir, de tão sereno que estava, e ela teve de lhe tocar para se certificar que ele já tinha partido.
Gostei de saber disso, que a partida fora serena...

Mas tenho saudades do meu D. ... :(

Sei que um dia o tornarei a ver, que estará à nossa espera do Outro Lado, para nos acarinhar e receber.
E espero que, onde quer que ele esteja agora, haja pássaros e borboletas para perseguir aos saltos no meio das ervas...

Descansa em Paz...