domingo, 13 de março de 2011

Angola, 13 de Março de 1975

Ela acorda, com dores.

No tempo final da gravidez, sabe o que as dores significam.
Acorda o marido, para a levar ao médico.

O marido não a quer levar (ela nunca teve a certeza do porquê da recusa dele... só da sensação de mágoa que isso lhe causou...) e pede à irmã, que é enfermeira, para levá-la.

Cheia de dores, cansada dos últimos tempos em que quase não conseguira dormir, ela sente-se sozinha, triste, desamparada.

Chegam ao Hospital.

Uma enfermeira diz-lhe:
"Os médicos já não estão a atender ninguém, tem de ir para a Maternidade."

O chão foge-lhe debaixo dos pés.
Com angústia, cheia de dores, responde:
"Mas eu sempre fui atendida aqui, não quero ir para outro lado."

A enfermeira olha-a, olha para a cunhada dela, sua colega, e acaba por ir ver do médico.

Ouvem-se tiros, e não estão assim tão longe.
Ela tem medo, por ela, pelos dela.
E tem muitas dores.

O médico aceita vê-la, e colocam-na num quarto onde uma mulher mais jovem, também em início de trabalho de parto, grita de dores.

Ela sofre, em silêncio.
Com as dores físicas, com a sensação de solidão.

A outra mulher pergunta-lhe:
"Não lhe dói?...", estranhando o silêncio dela.

Ela responde:
"Dói, claro que dói...", num tom resignado.

As horas passam.
As dores continuam, e a criança que traz no ventre, em vez de descer, sobe, entrando em sofrimento.
Decidem provocar o parto, dão-lhe medicação e levam-na, a pé, para a sala de partos.

Avançando a custo pelo corredor, vê uma mulher negra a ter um filho ali, no chão.
A imagem impressiona-a.
Ainda hoje, quando vê uma grávida, impressiona-lhe o saber do que custa a hora do parto.

Na sala de parto, vê-se rodeada de gente.
O médico e mais uns poucos estudantes de medicina.

Com todo o desconforto que já tinha, o medo que sente, a solidão que aperta, olhou para aquela gente toda com alguma frustração e resignação.
"Ao menos que tenham aprendido a fazer as coisas bem.", desabafou ela, anos mais tarde.

Às 13:45h, a criança nasce.
Menina.
A 4ª menina, a 5ª filha.

Na agitação do cenário de guerra, pesam-na mas não a medem: 3,750kg.

Pega-lhe, e acha-a perfeita.
Diferente das irmãs, no formato do rosto, da cabeça, e com os olhos amendoados.
Linda.

Durante uns tempos, ela olhou para a filha com pena de não ter sido um menino.
Queria outro rapaz, embora gostasse muito de meninas.

À tarde, o marido veio vê-la. Mas, por alguma razão que nunca percebeu, não permitiram a visita da irmã e ela acabou por se chegar a uma janela a acenar-lhe e ao cunhado e sobrinhos.

Foi um dos partos mais difíceis, e inesquecível, para ela.
Mas apesar do cenário de guerra, apesar das dores, das dificuldades, da solidão, fora abençoada com uma menina linda, saudável, perfeita...






Obrigada, Mãe, por tudo...

6 comentários:

  1. PARABÉNS FADITA! :-)
    Parabéns! Que festejes por muitos anos este dia com muita saúde e o que mais desejares.
    Muitos parabéns pela sorte de teres nascido naquela terra linda que apesar de sofrida tem gente boa... mesmo muito boa (as saudades são imensas).
    E ainda muitos muitos parabéns pela Mãe que tens.
    Um beijinho muito grande

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  2. Parabéns! E parabéns à mãe por ter feito uma filha tão bem feitinha!

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  3. que historia, ate estou arrepiada!
    parabens!

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  4. E hoje.... tantos anos depois... mãe e filha ainda perfeitas e ainda juntas :)

    E ... o dia fantástico! Parabéns às duas!

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  5. Há alturas em que temos de enfrentar as situações sozinhas. A da tua mãe foi essa (entre outras possivelmente).

    Parabéns às duas.

    Beijo doce

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  6. Parabéns, Fadita linda!
    Que contes muitos mais :D

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